Testemunho de Janeiro_2022

Testemunho de Janeiro_2022

Estes testemunhos preenchem as páginas da Lifeline, a revista mensal de Comedores Compulsivos Anónimos. São resultado do trabalho de pessoas que escrevem, não como autores profissionais, mas como comedores compulsivos que estão se recuperando através da prática do programa de Doze Passos.

O gosto pela vida – Rozanne S.” 

Estava a nascer um novo dia. O céu da manhã estava azul, a brisa matinal fresca. De repente, o meu telefone tocou.

“Oh, Rozanne! Exclamou a pessoa do outro lado da linha. “O que é que eu faço? Estou sempre a entrar e a sair de CCA já faz 12 anos, mas tenho apenas um dos pés dentro da porta de CCA. As reuniões são tão aborrecidas, os planos alimentares tão confusos. Ainda preciso de perder 9kgs, mas parece que não consigo. Não estou realmente feliz por dentro. Como é que se mantém o entusiasmo que você tem por CCA?  

Como mesmo? Esta era realmente uma questão séria e que levava à reflexão. O que acontece após estarmos em CCA por um tempo? Será que fazer o inventário pessoal se torna uma tarefa pesada? Será que os nossos momentos de prece e a meditação se tornam algo repetitivo?  Será que o nosso plano alimentar tão cuidadosamente engendrado se tornou numa rotina aborrecida? É mais fácil ir ao cinema do que a uma reunião? Será que os testemunhos dos outros me começam a parecer todos iguais?

Por vezes começamos a dormir em cima dos nossos louros. Talvez porque tenhamos mantido um peso normal por já algum tempo. As relações familiares estão tranquilas. A situação profissional está finalmente estável. A ameaça à nossa saúde que o excesso de peso significava, agora diminuiu. Já não exageramos nas reações aos acontecimentos. CCA torna-se numa rotina repetitiva.

Que aconteceu àquele sentimento nuvem cor de rosa de sobriedade que tínhamos quando éramos recém-chegados? Era tão bom, tudo era tão novo e tão cheio de esperança. Poderíamos atingir a recuperação! Para onde foi essa euforia?

Talvez não seja possível manter este nível de êxtase pela novidade para sempre, mas podemos alcançar algo ainda melhor – um prazeroso gosto pela vida sem excesso de comida.

Que podemos fazer para manter esse gosto pela vida independente de há quanto tempo estamos em CCA e do que a vida nos possa trazer?

Primeiro, temos de nos lembrar do inferno que era o nosso comer compulsivo. A falta de esperança e o desespero eram nossas companhias constantes. A frustração e a raiva tomavam conta de nós. Não parecia valer a pena viver a vida.

De seguida, devemos aceitar que com a ajuda de Deus, esse nosso passado sombrio é o nosso maior aliado – a chave para que possamos manter a nossa felicidade enquanto oferecemos alegria e paz aos outros. Devemos partilhar a nossa experiência e falar honestamente acerca da nossa recuperação. Vamos levar a esperança aos outros comedores compulsivos, que se obtivemos a dádiva da recuperação, eles também irão obtê-la.

Cada dia faremos um esforço para fazer” como se acreditássemos”.  Enquanto praticamos as nossas atividades diárias, sorrimos. Quando alguém pergunta, “como está?” respondemos, “Bem.” Não é nossa intenção negar os nossos sentimentos: É o contrário, através do ato de afirmar que estamos bem, afastamos a autocomiseração e sentimo-nos melhores.

Isto não elimina a necessidade de fazer inventários pessoais para “limpar” o lixo do passado e varrer da nossa vida os detritos do presente. O que esta atitude nos traz é o sentimento de “copo meio cheio” em vez de “para quê o esforço? – o meu copo está meio vazio.”

Mais importante, antes de nos apressarmos em começar cada novo dia, vamo-nos centrar nos nossos Poderes Superiores de eleição. De acordo com o Terceiro Passo, tomamos a decisão de confiar a nossa vontade e a nossa vida aos cuidados de Deus na forma em que o concebíamos. Que alívio! Agora podemos relaxar e desfrutar da vida.

No final, o programa é isso, tomar essa atitude. Desde o início da minha recuperação há 31 anos atrás, passando por duas recaídas e até à minha recuperação atual em CCA, eu aprendi que a vida não precisa de ser cheia de lágrimas. Não preciso de ser vítima do meu passado. Posso responsabilizar-me pelo meu presente e olhar para o meu futuro com esperança e entusiasmo. Eu posso ser gentil comigo mesma, ao mesmo tempo que os meus sentimentos podem ser firmes e cuidadosos comigo no que se relaciona com o que como diariamente.

Ter um peso normal é fantástico; desfrutar da vida a cada dia é um desafio positivo.

A recuperação é uma viagem, não um destino. Vamos fazer essa viagem juntos. A “estrada para o destino feliz” mencionada no Grande Livro pode ser percorrida arrastando os pés, mas também pode ser caminhando, saltitando ou correndo.

Como quer viver o resto da sua vida? A escolha é sua.

Janeiro de 1991